O Corpo — O Supremo Alimento da Psique
Mulheres que Correm com os Lobos (Clarissa Pinkola Estés)
Capítulo 7 – O corpo jubiloso: A carne selvagem
Página 254: “Se lhe ensinarem a detestar o próprio corpo,
como poderá ela amar o corpo da mãe, que tem a mesma estrutura que o seu?5 — ou
o corpo da avó, ou das suas filhas também? Como poderá ela amar os corpos de
outras mulheres (e homens) próximas a ela que tiverem herdado o corpo dos
mesmos antepassados? Semelhante agressão a uma mulher destrói seu legítimo
orgulho de parentesco com sua própria gente e lhe rouba a alegria natural que
ela sinta por seu corpo, não importa qual seja sua altura, tamanho ou forma. No
fundo, a agressão ao corpo da mulher é uma agressão de longo alcance que atinge
tanto os que vieram antes dela quanto os que chegarão depois.”
Este trecho de “Mulheres que Correm com os Lobos”, de
Clarissa Pinkola Estés, é uma denúncia profunda e visceral sobre como a
opressão estética não é apenas um ataque individual, mas um ataque coletivo,
ancestral e transgeracional.
Na psicologia analítica, o corpo feminino carrega não só a
materialidade, mas também os arquétipos que atravessam o inconsciente coletivo.
Quando uma mulher é ensinada a odiar seu corpo, ela não está rejeitando apenas
a si mesma — ela está, inconscientemente, rompendo os laços com o arquétipo
materno, com a linha das Grandes Mães que a antecedem.
Esse rompimento gera feridas profundas no self feminino,
criando um vazio onde antes deveria existir pertencimento, continuidade,
nutrição e orgulho pela própria linhagem. A rejeição ao corpo se torna também
uma rejeição simbólica ao ventre que a gerou, ao sangue que a nutriu e à
memória que lhe pertence.
Na maioria das mitologias, o corpo feminino é visto como
território sagrado — é a terra, o útero, o caldeirão da vida. A deusa-mãe, seja
ela Gaia, Deméter, Nyx ou Cerridwen, representa não apenas a criação, mas
também a continuidade.
Quando uma cultura ensina a mulher a rejeitar sua carne, sua
gordura, sua pele, seus traços herdados, está, na verdade, desconectando-a do
mito original da Grande Mãe. Ela deixa de se perceber como extensão de um útero
primordial e passa a se sentir isolada, desconectada e inadequada. Esse é,
mitologicamente, um ato de profanação do sagrado feminino.
Filosoficamente, podemos olhar para esse trecho como uma
reflexão sobre como o corpo feminino foi transformado de sujeito em objeto.
Simone de Beauvoir já dizia: “Não se nasce mulher, torna-se mulher” —
uma denúncia do processo social que molda a mulher a partir de padrões
externos.
A rejeição do próprio corpo é uma forma de alienação
ontológica — a mulher deixa de ser para si e passa a ser para o olhar do
outro. Ela deixa de habitar seu corpo como lar, e passa a viver como hóspede,
muitas vezes desconfortável, nesse corpo que não sente mais como seu.
Além disso, é uma agressão epistemológica, pois
deslegitima o saber ancestral do corpo — o corpo que menstrua, que sangra, que
gera, que sente, que envelhece, que guarda memórias. Isso rompe não só com a
própria mulher, mas com toda a cadeia de transmissão de saber feminino.
Este não é um ataque isolado. Quando uma mulher odeia seu
corpo, ela também rompe o espelho onde poderia ver sua mãe, sua avó, suas
ancestrais. Ela rejeita aquilo que carrega geneticamente, emocionalmente e
espiritualmente.
Essa agressão não para nela — ela se propaga. Ela educará
filhas e filhos a partir desse lugar de ruptura. Gerará gerações desconectadas
do orgulho de pertencer, da aceitação dos corpos reais, dos corpos vivos,
imperfeitos e, por isso mesmo, profundamente sagrados.
O ódio ao corpo feminino não é um efeito colateral — é uma estratégia
sistemática de dominação patriarcal. Quando uma mulher se desconecta de sua
carne, ela perde sua força vital, seu poder criativo, sua capacidade de se
reconhecer como tecelã da própria vida.
Ao destruir a autoestima corporal, destrói-se também:
- A
transmissão de saberes ancestrais;
- O
orgulho da linhagem;
- A
soberania sobre o próprio território físico e simbólico;
- A
conexão com a natureza cíclica e selvagem da vida.
Quando uma mulher odeia seu corpo, ela não percebe que está
odiando também o corpo da mulher que a carregou no ventre, das mulheres que a
nutriram com sangue, leite e história. O patriarcado sabe: uma mulher
desconectada da sua carne é uma mulher desconectada do seu poder. Curar essa
ferida não é apenas um ato de amor próprio — é um ato de rebelião, de magia e
de retorno à linhagem das que nunca foram domadas.
Página 255: “Destruir o vínculo instintivo da mulher com
seu corpo natural subtrai-lhe a confiança. Faz com que ela insista em descobrir
se é uma boa pessoa ou não, e baseia sua auto-estima na sua aparência em vez de
na sua essência. Ela é pressionada a gastar sua energia preocupando-se com a
quantidade de alimento que consome, com os números na balança ou na fita
métrica. Essa destruição lhe dá uma idéia fixa e influencia tudo o que ela faz,
planeja e prevê. No mundo instintivo, é inconcebível que uma mulher viva absorta
desse jeito com sua aparência.”
Na psicologia arquetípica, o corpo instintivo está
diretamente ligado ao arquétipo da Mulher Selvagem, aquela que vive em
consonância com seus ritmos, sua intuição, seus desejos, seus ciclos.
Destruir o vínculo da mulher com seu corpo natural é uma
forma de amputação psíquica. Ela é cortada de sua função instintiva —
aquela que saberia, sem precisar perguntar, o que é certo, seguro, saudável,
prazeroso e verdadeiro para si.
Consequência psíquica: Ela deixa de confiar em seus
próprios sinais internos e passa a buscar validação fora — na balança, na fita
métrica, no espelho, na opinião alheia. Seu eixo de poder, que deveria estar
dentro, é sequestrado e projetado para o mundo externo.
Isso gera um colapso do Self feminino: ela não mais
se percebe como um ser pleno, mas como uma imagem a ser constantemente
corrigida, julgada, monitorada.
Filosoficamente, isso dialoga com o conceito de “olhar do
outro”, profundamente trabalhado por Sartre e também por Simone de
Beauvoir.
A mulher passa a existir não em sua essência, mas em
sua aparência.
O ser dela é sequestrado pelo parecer.
Ela não vive mais para si, mas para ser olhada, medida,
aprovada. Sua vida torna-se, assim, um eterno teatro — onde o palco é o corpo e
o roteiro é o padrão impossível da cultura patriarcal.
Isso é uma condenação ontológica. Ela deixa de ser
sujeito e se torna objeto.
Nas tradições ancestrais, o corpo é o primeiro templo. O
corpo feminino, em especial, carrega os mistérios da criação, da transformação
e da morte. É útero, sangue, leite, carne e espírito.
Subtrair da mulher o vínculo com seu corpo é um ato de profanação
sagrada.
É como invadir um templo e quebrar os altares. É roubar dela os mapas que a
conectam com a terra, com os ciclos lunares, com os elementos, com a própria
Deusa interior.
Na mitologia, isso é equivalente à narrativa de Perséfone
raptada por Hades — quando a mulher é arrancada do mundo natural, do mundo
das flores, da superfície, e arrastada para o submundo da prisão, da servidão,
da desconexão.
Esse trecho denuncia como o corpo feminino foi transformado
em um território colonizado.
A colonização externa — social, patriarcal, econômica — se
internaliza.
A mulher aprende a ser sua própria carcereira.
Ela policia seu corpo, restringe seus prazeres, mede seus próprios centímetros,
vigia seus próprios desejos, e vive uma vida regida por culpa, ansiedade e
insuficiência.
O corpo, que deveria ser lar, torna-se prisão.
No mundo natural, como Clarissa diz, é inconcebível que
uma loba se preocupe se suas coxas são grossas ou finas.
A loba vive para caçar, nutrir, proteger, amar, correr
livre.
O feminino instintivo é soberano, selvagem, intuitivo.
Quando a mulher é arrancada dessa lógica, ela perde sua
bússola interna.
Ela passa a usar sua energia psíquica, vital e mágica não para criar, não para
amar, não para transformar — mas para se mutilar simbolicamente, tentando caber
em padrões que foram desenhados justamente para que ela nunca caiba.
Isso a impede de acessar seus dons, sua visão, sua
criatividade, sua sexualidade plena e seu poder espiritual.
Toda mulher que volta a confiar nos próprios instintos está
praticando magia ancestral. Ela está descolonizando seu corpo, desprogramando
sua mente e libertando seu espírito. Romper com essa ilusão estética não é um
ato pequeno — é um ritual de renascimento. É retomar seu lugar no círculo das
mulheres selvagens, das filhas da Deusa, das que se recusam a ser domesticadas.
Página 256: “A angústia quanto ao próprio corpo subtrai à
mulher uma fatia considerável da sua vida criativa e da sua atenção a outros
aspectos.
Esse estímulo a que a mulher comece a tentar esculpir seu
próprio corpo é extraordinariamente semelhante ao processo de escavar a própria
terra, queimá-la, descascar suas camadas, desnudá-la até os ossos. Onde exista
uma ferida nas psiques e nos corpos das mulheres, existe uma ferida
correspondente no mesmo local na própria cultura e, finalmente, na própria
natureza. Numa psicologia de caráter verdadeiramente holístico, todos os
universos são interpretados como interdependentes, não como entidades autônomas.
Não é de espantar que na nossa cultura coexistam a questão de esculpir o corpo
natural da mulher, a questão correlata de entalhar a paisagem e ainda a de
retalhar a cultura em partes que estejam na moda. Apesar de uma mulher não ter
condição de parar a dissecação da cultura e das terras da noite para o dia, ela
tem condição de interromper esse processo no seu próprio corpo.”
Clarissa Pinkola Estés faz aqui um chamado à consciência
holística, mostrando que a dor da mulher em seu corpo não é isolada: ela é ecossistêmica,
coletiva, arquetípica e cultural.
Jung afirmava que a psique individual está intrinsecamente
ligada à psique coletiva. Neste trecho, vemos isso com clareza: a mulher
ferida em seu corpo representa uma civilização ferida em sua alma.
O ato de tentar "esculpir o próprio corpo",
segundo Clarissa, é um símbolo arquetípico de dissociação. A mulher,
desconectada do corpo-instinto, do corpo-casa, passa a se ver como matéria a
ser moldada, como argila em mãos externas — ou como terra devastada.
Ferida individual = ferida cultural = ferida arquetípica.
Esse corte psíquico é, na verdade, um sintoma de um sistema
que separa o corpo da alma, a mulher da natureza, a beleza da essência.
A imagem usada por Clarissa é violenta e visceral: escavar,
queimar, descascar a terra até os ossos. Essa linguagem é ritualística e remete
a rituais de sacrifício e destruição do sagrado.
Mitologicamente, isso evoca o destino de muitas deusas da
terra — como Deméter, Gaia, Ísis, que sofrem perdas, invasões, exílios
ou mutilações simbólicas. A terra-mãe, como o corpo da mulher, é explorada,
retalhada, violada — tudo em nome do controle, da estética, da ordem
patriarcal.
Quando a mulher mutila seu corpo para caber no molde, ela
repete em sua carne o que a cultura faz com a terra: extração, exaustão,
devastação.
Essa parte do texto é um eco direto das ideias da
ecopsicologia: a noção de que o sofrimento humano e a destruição ambiental
estão interligados.
A mulher que tenta se adaptar aos padrões irreais de corpo
impõe a si uma violência que reflete a violência feita à natureza: desmatamento,
mineração, monocultura.
Assim como se "desnuda a terra até os ossos",
também se "desnuda a mulher" de suas curvas naturais, seus pelos, seu
sangue, seus traços únicos.
O corpo da mulher e o corpo da Terra estão entranhados um no outro,
ambos alvos da mesma ideologia de dominação e controle.
Clarissa afirma que a mulher, mesmo sem poder parar o
sistema, pode interromper o processo em seu próprio corpo. Essa é uma
afirmação de poder espiritual:
"Não posso mudar o mundo sozinha, mas posso me recusar
a ser cúmplice da sua destruição dentro de mim."
Essa decisão de não continuar a escavação é um rito
de passagem.
É o momento em que a mulher:
- Escolhe
habitar seu corpo com presença;
- Rejeita
o ideal estético como única forma de valor;
- Cura
o elo entre sua carne e sua alma;
- Torna-se
guardião do seu território sagrado.
É nesse momento que ela volta a ser uma sacerdotisa de si
mesma.
Clarissa toca ainda em outro ponto central: vivemos em uma
cultura fragmentada — onde tudo é dividido, rotulado, estético, superficial.
A mulher, por essência arquetípica, é integradora.
Ela costura opostos, reúne partes, devolve o sentido.
Quando ela se vê forçada a viver fragmentada — corpo separado da alma, beleza
separada da saúde, identidade separada da ancestralidade —, ela adoece. E o
mundo com ela.
Por isso, o ato de recusar-se a retalhar o próprio corpo
é um gesto simbólico de cura do coletivo.
“O corpo da mulher é o último território sagrado. Onde ela
põe limites, a cultura começa a mudar.”
Este trecho é um convite — e também um oráculo. Ele nos diz
que o caminho de volta ao feminino autêntico, selvagem, criador e
instintivo, começa com a recusa de continuar a guerra contra o próprio corpo.
Essa recusa é mágica.
É ritual.
É alquimia.
É um feitiço de proteção ancestral.
Página 258 e 259: “Há quem diga que a alma anima o corpo.
No entanto, e se resolvêssemos imaginar por um instante que é o corpo que anima
a alma, que a ajuda a se adaptar à vida concreta, que analisa e traduz, que
fornece o papel em branco, a tinta e a pena com os quais a alma pode escrever
nas nossas vidas? Suponhamos, como nos contos de fadas em que as coisas mudam
de forma, que o corpo é um Deus por si só, um mestre, um mentor, um guia
autorizado. E daí? Seria prudente passar a vida inteira torturando esse mestre
que tem tanto a dar e a ensinar? Desejamos passar a vida inteira permitindo que
os outros depreciem nossos corpos, julguem-nos, consideremnos defeituosos? Será
que temos força suficiente para renegar o pensamento geral e prestar atenção,
com profundidade e sinceridade, ao nosso corpo como um ente poderoso e sagrado?
Está errada a imagem vigente na nossa cultura do corpo
exclusivamente como escultura. O corpo não é de mármore. Não é essa a sua
finalidade. A sua finalidade é a de proteger, conter, apoiar e atiçar o
espírito e alma em seu interior, a de ser um repositório para as recordações, a
de nos encher de sensações — ou seja, o supremo alimento da psique. É a de nos
elevar e de nos impulsionar, de nos impregnar de sensações para provar que
existimos, que estamos aqui, para nos dar uma ligação com a terra, para nos dar
volume, peso. É errado pensar no corpo como um lugar que abandonamos para alçar
vôo até o espírito. O corpo é o detonador dessas experiências. Sem o corpo não
haveria a sensação de entrada em algo novo, de elevação, altura, leveza. Tudo
isso provém do corpo. Ele é o lançador de foguetes. Na sua cápsula, a alma
espia lá fora a misteriosa noite estrelada e se deslumbra.”
Aqui, Clarissa não apenas questiona a visão moderna,
cartesiana e patriarcal que separa corpo e alma — ela desmantela um
paradigma inteiro de dissociação, propondo uma visão absolutamente sagrada,
integrada e reverente ao corpo como instrumento de manifestação da alma.
A proposta que Clarissa traz já começa com uma quebra
radical do pensamento ocidental:
"E se não for a alma que anima o corpo, mas o corpo que
anima a alma?"
Isso subverte a lógica dualista cartesiana
(corpo-matéria = inferior | alma-espírito = superior), que regeu o Ocidente
desde Descartes e que foi uma das raízes da opressão tanto do feminino quanto
da natureza.
Aqui, ela propõe um paradigma encarnado, enraizado,
imanente, onde o corpo não é um mero veículo da alma — ele é a própria
manifestação viva do sagrado.
O corpo não é prisão da alma. É seu templo, seu mestre, seu
oráculo, seu altar.
Quando ela afirma que o corpo é um deus por si só, ela
convoca uma visão que ecoa as tradições ancestrais — especialmente as culturas
matricêntricas e os cultos à Grande Mãe.
Na espiritualidade do feminino, não há separação entre
espírito e matéria.
O corpo — com seus ritmos, sua carne, seu sangue, seus ossos — é
manifestação da Deusa.
O ventre, os seios, o sangue menstrual, as rugas, os cabelos
brancos, as marcas do tempo… tudo isso é linguagem sagrada.
Torturar o corpo, rejeitá-lo ou odiá-lo não é apenas um ato
de violência pessoal — é uma blasfêmia espiritual.
É como destruir um templo, incendiar um altar, profanar o que é divino.
Na psicologia arquetípica, o corpo não é apenas suporte da
psique — ele é um dos meios mais diretos de acesso ao Self, à totalidade
psíquica.
O corpo guarda:
- As
memórias ancestrais (memória celular, inconsciente coletivo);
- Os
instintos primitivos, a bússola interior;
- Os
mapas somáticos do prazer, do limite, da dor, da cura;
- O
portal para estados alterados de consciência (transe, êxtase, meditação,
sonho, orgasmo).
Clarissa nos lembra:
“Sem o corpo, não há êxtase, não há transcendência.”
O corpo é o próprio detonador espiritual. É o foguete. É a ponte entre o
mundo terreno e o mundo do invisível.
Assim como o corpo da mulher foi reduzido a objeto, a
cultura também transformou a Terra em coisa — em recurso, em mercadoria.
O corpo que sofre é a Terra que sofre.
A mulher que rejeita seu corpo reflete uma cultura que rejeita o planeta.
Quando Clarissa diz que o corpo “nos dá peso, volume,
ligação com a Terra”, ela está falando da sacralidade da nossa encarnação.
Somos matéria viva, feita dos mesmos elementos das estrelas,
das pedras, dos rios e das árvores.
Negar o corpo é negar a própria existência.
Aceitá-lo — com reverência — é um ato ecológico, político, espiritual e
revolucionário.
Em várias tradições religiosas patriarcais, o corpo é visto
como obstáculo à iluminação. Clarissa destrói essa narrativa ao afirmar que:
“Sem o corpo, não haveria a sensação de entrada em algo
novo, de elevação, altura, leveza.”
O corpo é quem permite a experiência do sublime.
É através dos sentidos — visão, toque, olfato, audição, paladar — que a alma
percebe a beleza, o êxtase e o mistério da vida.
Ele é, portanto, a própria ferramenta da alma para viver
a experiência terrena como uma aventura sagrada.
O corpo não é o cárcere. É o portal.
Este trecho é uma invocação.
Uma invocação para que cada mulher — e cada ser — retorne ao
seu corpo como quem retorna ao templo.
- Ao
ventre, como altar da criação.
- Aos
seios, como fonte de nutrição física e energética.
- À
pele, como fronteira sagrada.
- Aos
ossos, como arquivos ancestrais.
- Ao
sangue, como oferenda cíclica.
- À
respiração, como oração viva.
Honrar o corpo é honrar a Deusa.
Curar o corpo é curar a alma.
Habitar o corpo é habitar o mundo.
O Corpo — O Supremo Alimento da Psique
O corpo é mais do que carne, osso e sangue. Ele é a matéria
onde a alma finca suas raízes, é o templo onde o espírito aprende a viver a
experiência do mundo. Nele, estão impressos os mapas da nossa ancestralidade,
os registros dos nossos afetos, traumas, amores, dores e êxtases.
Quando negamos, odiamos ou tentamos esculpir esse corpo para
caber em moldes alheios, não estamos apenas ferindo a carne — estamos subnutrindo
a psique. Uma alma que não habita plenamente seu corpo se torna uma alma
faminta, exilada, perdida, desconectada do instinto, da intuição, da
criatividade e da potência vital.
É no corpo que a alma encontra seus alimentos sagrados:
- O
toque que acalma.
- O
movimento que vitaliza.
- O
prazer que cura.
- O
silêncio que ancora.
- A
respiração que desperta.
- O
sangue que recorda que somos cíclicas, vivas, ancestrais.
Sem corpo não há sensação, não há experiência, não há
êxtase. É o corpo que fornece à alma os sentidos para que ela se reconheça
viva. É ele que permite que a psique se nutra da beleza do mundo, do cheiro da
terra molhada, do som da chuva, do calor do sol, do abraço, do riso, da
lágrima.
O corpo é o solo fértil onde a alma floresce.
Quando esquecemos disso, a psique adoece. Quando retomamos
esse vínculo, a alma volta a cantar. E é nesse retorno amoroso ao corpo — não
como objeto, mas como lar, como guia, como altar — que recuperamos nossa
inteireza, nossa soberania e nossa verdadeira liberdade.
O corpo não é prisão.
O corpo não é obstáculo.
O corpo é o portal, o foguete, o veículo e o próprio caminho.
Cuidar do corpo com reverência não é vaidade — é
espiritualidade encarnada.
Honrar o corpo não é futilidade — é alimento sagrado da psique.
Habitar o corpo é, antes de tudo, um ato radical de amor, de cura e de
reconexão com o mistério da vida.
Que possamos, então, lembrar:
O corpo não é algo que temos. O corpo é algo que somos.
E nele, a alma dança.
Comentários
Postar um comentário